Houve um tempo que sem nenhum motivo eu não concordava com a comemoração do dia das mulheres. Eu era completamente outra e acreditava que isso trazia ainda mais diferença no tratamento dos homens e mulheres, como se fosse a prova da desigualdade.
Acontece que sofri na pele literalmente a dor de ser mulher quando fui vítima de violência doméstica. Após dar entrada ao processo da Lei Maria da Penha, tive meu processo arquivado por um promotor que ria da minha cara e dizia que na próxima vez era melhor eu ter câmeras de vídeo e áudio para ter testemunha porque minha palavra, fotos e laudo do IML – Instituto Médico Legal não eram suficientes. Assim mais uma vez sofri violência ao receber uma decisão de arquivamento do processo. Busquei me socorrer no direito, consegui a reabertura processual e dar seguimento ao mesmo, que hoje já está encerrado.
A discriminação, a violação aos direitos inerentes da pessoa humana e violência contra a mulher, não faz distinção, ela atinge a todas nós, basta ser mulher ou do gênero feminino.
Hoje comemoro esse dia internacional de outro lugar. Um lugar que olha com amor para cada conquista feminina no Brasil e no mundo. Ainda temos muito a caminhar, mas já tivemos inúmeras e grandes conquistas para nossos direitosno âmbito do Direito Criminal, Direito de Família e em todas as outras esferas tais como:
1946: As mulheres puderam exercer o direito de voto e terem o direito de serem votadaspela Constituição de 46.
1962: O Estatuto da Mulher Casada determinou que as mulheres não precisassem mais da autorização do marido para trabalhar fora, receber herança, comprar ou vender imóveis, assinar documentos e até viajar.
1977: Com a Lei do Divórcio o matrimônio deixou de ser indissolúvel, ainda assim, concedeu a possibilidade de um novo casamento, mas somente por uma vez.
1988: O Art. 7º inciso XXX da Constituição Federal estabelece que é proibida a diferença de salários, de exercício de funções e de critério de admissão por motivo de sexo, cor ou estado civil. A Constituição de 1988, em seu artigo 225, estabelecia que o casamento civil poderia ser dissolvido pelo divórcio, mas desde que cumprida a separação judicial por mais de um ano nos casos expressos em lei, ou comprovada separação de fato por mais de dois anos.
1989: A Lei 7.841, de 17.10.1989, revogou o art. 38 da Lei do Divórcio (1977), eliminando a restrição à possibilidade de divórcios sucessivos.
1990: O Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA estabelece a igualdade de condições do pai e da mãe no exercício do pátrio poder.
2002: A falta de virgindade da mulher deixou de ser motivo para anular casamento.
2005: O termo “mulher honesta” foi retirado do Código Penal.
2006: Lei 11.340/2006, de 07.08.2006, conhecida como Lei Maria da Penha protege as mulheres contra a violência física psicológica, moral, sexual e patrimonial.
2008: Lei 11.804/2008 dá as mães o direito aos Alimentos Gravídicos, ou seja, direito a receber alimentos para o filho da concepção ao parto, inclusive os referentes à alimentação especial, assistência médica e psicológica, exames complementares, internações, parto, medicamentos e demais prescrições preventivas e terapêuticas.
2015: A Lei 13.104/2015, conhecida como Leido Feminicídio, torna crime hediondo o assassinato de mulheres decorrente de violência.
2015: A Lei 13.112/2015 dá às mães o direito de registrar filhos no cartório sem a presença do pai.
2018: Criminalização da Importunação Sexual regulamentada pela Lei 13.718/2018.
2019: A Lei 13.894/2019 tornou prioridade o divórcio para vítimas de violência doméstica dando competência as Varas de Violência Doméstica para realizá-los.
2021: Lei 14.164/2021 alterou a Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996 (Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional), para incluir conteúdo sobre a prevenção da violência contra a mulher nos currículos da educação básica, e institui a Semana Escolar de Combate à Violência contra a Mulher.
2022: Distribuição gratuita de absorventes a estudantes dos ensinos fundamental e médio mulheres em situação de vulnerabilidade e presidiárias Lei 14.214/2021
2022: O Plenário aprovou o Projeto de Lei 1941/2022 que reduziu para 21 anos a idade para a realização de laqueadura ou vasectomia, sem a necessidade de autorização do cônjuge.
Hoje eu vejo e honro a grandeza de comemorarmos o Dia Internacional das Mulheres que foi oficializado pela Organização das Nações Unidas (ONU) em 1975.
O Dia Internacional da Mulher celebrado em 08 de Março simboliza a luta histórica das mulheres por condições sociais, financeiras, profissionais e tratamento em todas as esferas equiparadas às dos homens.
Simboliza ainda a luta de poder tomar suas próprias decisões, direito de ser dona do seu próprio corpo e a luta por políticas públicas mais amplas e eficazes em prol das mulheres e principalmente o fim da violência.
A busca da proteção da violência contra a mulher não se restringe apenas contra a violência física. A lei protege cinco tipos de violência: física, moral, patrimonial, sexual e psicológica.
O Brasil registrou em 2022 um estupro a cada 10 minutos e um feminicídio a cada 7 horas, ou seja, 03 (três) mulheres são mortas por dia, segundo um levantamento do Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP).
A Lei 11.340/06, conhecida como Lei Maria da Penha é considerada pelo Fundo de Desenvolvimento da ONU uma das três melhores leis do mundo.
Trata-se de um marco no enfrentamento à violência contra a mulher e, verdadeiro instrumento da cidadania, trouxe mecanismos importantes de amparo e proteção para as vítimas, além de aumentar a conscientização sobre a violência de gênero.
A Lei Maria da Penha, de fato, não impede que a violência contra mulher aconteça. Contudo, não se pode esquecer que antes dela não existia uma rede de proteção, tampouco mecanismos eficientes de denúncia.
A violência contra as mulheres acontece por meio de ações e agressões silenciosas. Nós precisamos dar um basta nisso e dar voz a cada mulher. Precisamos falar sobre violência, precisamos aprender sobre violência desde cedo para ser possível identificá-la e não aceitar.
Atrás de todo homem que violenta uma mulher e de toda mulher que sofre violência existe uma mãe, uma mulher que os criou, assim é tempo de nós educarmos os filhos homens a respeitarem as mulheres, é tempo de educarmos as filhas mulheres a serem donas do seu destino, a não depender de ninguém, é tempo de nós sermos o exemplo e não permitir sofrer violência dentro dos nossos lares é tempo de sermos a mudança para as próximas gerações.
É tempo de concretizar as políticas públicas que incluíram conteúdo sobre a prevenção da violência contra a mulher nos currículos da educação básica, tempo de as escolas trabalharem com educação socioemocional, financeira, familiar. Além disso, educarem sobre xenofobia, racismo, homofobia, drogas. É tempo de a educação abarcar a integralidade do ser humano.
Nós mulheres precisamos reaprender a cuidar umas das outras como nossas ancestrais que se sentavam em roda cuidando do fogo. Aprender a não julgar umas as outras e acolher, ajudar a se defender. Aprender desde cedo que podemos sim estabelecer limites e não aceitar mais nenhuma forma de violência, abuso.
Não se cale. Peça ajuda. Denuncie.
A nossa força irá ter resultados quando todas as mulheres tiverem coragem de defender outras mulheres. Temos que nos unir, fortalecer, apoiar, para que juntas possamos ter mais direitos e a efetivação real e concreta desses direitos.
NÃO É NOSSA CULPA. NÃO É MESMO.
Podemos e devemos sim cultivar amor-próprio, nos empoderarmos e não aceitar nenhum tipo de abuso. A violência doméstica termina na agressão física, mas ela começa com palavras, situações constrangedoras, dentre outras. Nesse momento que é tempo de agir. Tempo de olhar para nós mesmas, de nos respeitar em primeiro lugar, de aprender a colocar limites e dizer: aqui não.
Somos humanos, errantes, somos a perfeição da imperfeição.
Chega! Basta!
Com amor Rosemary Marostica
Colunista:
Rosemary Marostica – advogada e terapeuta holística.
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Rosemary Marostica é filha de Alcides Marostica e Rozi Luiza Stoppa, brasileira, MÃE do Lorenzo. Se formou em direito em 2001, tendo concluído Pós Graduação em Direito Processual Civil e Pós Graduação em Direito Público. Conciliadora e Mediadora pelo Conselho Nacional de Justiça. Atualmente é professora de Constelação Familiar na Sociedade Brasileira de Direito Sistêmico, atua com direito humanizado que olha para o cliente de forma integral. Acredita em um direito leve, justo e eficaz.
Em 2009 iniciou estudos de autoconhecimento, espiritualidade e Práticas Integrativas. Realiza atendimentos sistêmicos e terapêuticos de constelação familiar e Iopt, Reike, Barras de Access, Movimentos Essenciais presenciais e online em todo Brasil e no Exterior.
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