O cinema produzido longe dos grandes centros brasileiros volta a ganhar projeção internacional. “Memória de Elefante”, longa dirigido pelo mato-grossense Severino Neto, foi selecionado para o 56º International Film Festival of India (IFFI), realizado em Goa.

Criado em 1952 e reconhecido pela Federação Internacional de Associações de Produtores Cinematográficos (FIAPF), o festival é uma das mais importantes vitrines da Ásia para novas cinematografias, reunindo obras que ampliam repertórios e convidam o público global a conhecer outras realidades.

A chegada do filme ao IFFI marca um momento simbólico: um cinema enraizado no Centro-Oeste, produzido a partir das vivências do cerrado, alcança um palco internacional de grande relevância. Severino, já em Goa para acompanhar a exibição, leva consigo a representatividade de narrativas que surgem de territórios por tanto tempo invisibilizados no audiovisual brasileiro.

Um drama do cerrado que dialoga com o mundo

Crédito: Cena do filme “Memórias de Elefante” – Foto divulgação.

No centro da narrativa, uma mulher de 60 anos tenta reorganizar a própria vida após um luto que nunca se fechou. Ela administra um santuário de elefantes ameaçado pelo avanço da soja — um microcosmo de um Brasil rural em permanente disputa entre conservação e expansão agrícola.

Esse cotidiano, marcado por resistência e silêncio, é transformado quando um afeto inesperado com um jovem da comunidade desestabiliza certezas e confronta preconceitos. Paralelamente, o romance entre dois jovens do mato revela camadas profundas de desigualdade, violência e desejo.

O filme se ancora em personagens que, mesmo surgindo de um território específico, ecoam dores e afetos universais: a busca por pertencimento, a fragilidade do amor em tempos de conflito e a necessidade de defender aquilo que nos constitui.

Inspirado no Santuário de Elefantes Brasil (SEB), em Chapada dos Guimarães, o filme carrega a paisagem como personagem essencial. O SEB, único santuário de elefantes da América Latina, é reconhecido como um espaço de regeneração, onde a natureza encontra tempo para se recompor e os animais reaprendem a viver em liberdade. Essa simbologia de cura permeia toda a obra.

Centro-Oeste em evidência: o regional que se torna global

Crédito: Cena do filme “Memórias de Elefante” – Foto divulgação.

A seleção no IFFI consolida um movimento crescente do audiovisual do Centro-Oeste: produções que, ao preservar raízes locais, conseguem dialogar com públicos de diferentes culturas. É um lembrete de que histórias nascidas do cerrado, do pantanal e do interior brasileiro possuem densidade estética e emocional capazes de cruzar fronteiras.

“Memória de Elefante” amplia esse percurso ao apresentar uma visão sensível e crítica de um Brasil profundo, que raramente encontra espaço nas telas. O filme reafirma que o regional se torna global quando é contado com verdade narrativa e identidade.

Reconhecimentos que antecedem a estreia internacional

Crédito: Foto divulgação

Antes de chegar ao festival indiano, o longa já chamava atenção em importantes laboratórios de roteiro e desenvolvimento. Entre as principais conquistas, destacam-se:

  • Finalista no 4º Festival de Roteiros Guiões (Lisboa)
  • Vencedor do pitching no 12º Curso de Formação Profissional do Núcleo de Desenvolvimento de Roteiros Audiovisuais
  • Selecionado no 1º MT LAB
  • Premiado na categoria Work in Progress no Mercado Sur Frontera, no 14º Festival de Cinema da Fronteira
  • Selecionado no Noronha 2B WIP LAB

Esse percurso reforça a solidez estética do filme, marcado por forte caráter social e pela paisagem tratada como extensão emocional dos personagens.

Severino Neto: um nome em ascensão no cinema autoral brasileiro

Crédito:  Severino Neto em ação na filmagem de “Memória de Elefante” -Foto divulgação

Roteirista, diretor e montador, Severino Neto consolida-se como uma das vozes mais consistentes do cinema autoral contemporâneo. Seus projetos já circularam por laboratórios de referência, como Ibermedia (Madri), Guiões (Lisboa), Bolivia Lab (Cochabamba), Icumam Lab e Sesc Novas Histórias.

Entre seus trabalhos, estão o longa “A Batalha de Shangri-Lá” (VOD) e os documentários “Chumbo” (TV Brasil) e “Sísmico” (Amazon Prime Video Brasil). “Memória de Elefante” é seu segundo longa de ficção com circulação internacional e reafirma sua habilidade em construir narrativas sensíveis, territoriais e profundamente humanas.

“Memória de Elefante” chega ao IFFI não apenas como um filme selecionado, mas como um testemunho da força criativa que brota do cerrado e se projeta para o mundo. A presença da obra em Goa reafirma que o cinema brasileiro, quando enraizado em verdade, território e humanidade, encontra ressonância para além de fronteiras geográficas.

Ao levar para a Ásia uma narrativa que nasce da terra, das memórias e das tensões do Brasil profundo, Severino Neto amplia o alcance de um cinema que ainda disputa espaço, mas que já demonstra maturidade estética e vigor autoral. É um passo importante para o audiovisual do Centro-Oeste e um convite para que mais histórias desse território sejam vistas, escutadas e reconhecidas.

O filme segue seu percurso internacional carregando a delicadeza de seus personagens, a potência simbólica dos elefantes e a resistência silenciosa do cerrado — lembrando que, quando a arte brota com autenticidade, ela encontra sempre novos caminhos para florescer.

Não perca a oportunidade de acompanhar “Memória de Elefante” e conhecer a força do cerrado nas telas.

Beatriz Negrão
Editora Sucursal São Paulo e Colunista
Carreira desenvolvida na área de Comunicação, atuando em empresas no Brasil e no exterior. Jornalista, Publicitária Pós-Graduada em Marketing pela ESPM. Como Jornalista escreveu matérias em diversas revistas do setor e proferiu palestras viajando pelo País, abordando o tema Agribusiness, entre outros.
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